Despacho Normativo n.º 9/2006

Despacho Normativo n.º 9/2006, de 16 de Fevereiro

De acordo com o n.º 1 da base XIII da Lei de Bases da Saúde, Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, «o sistema de saúde assenta nos cuidados de saúde primários, que devem situar-se junto das comunidades».
Neste sentido, o Programa do XVII Governo Constitucional dá particular enfoque à reorganização dos cuidados de saúde primários, bem como à sua importância numa prestação de cuidados de saúde aos cidadãos mais próxima, adequada, efectiva e eficiente.
Considerando que a promoção e garantia dos cuidados de saúde dirigidos tanto aos indivíduos e famílias como aos grupos e à comunidade são atribuições dos centros de saúde;
Considerando que o Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio, veio estabelecer o regime de criação, organização e funcionamento dos centros de saúde, estruturando-os em unidades funcionais, com especial ênfase para a unidade de saúde familiar (USF) caracterizada como «a unidade elementar de prestação de cuidados de saúde a uma população identificada através da inscrição em listas de utentes»;
Considerando a necessidade de implementar o Decreto-Lei n.º 157/99, repristinado pelo Decreto-Lei n.º 88/2005, de 3 de Junho, importa, para já, regulamentar os termos, as condições e os procedimentos conducentes ao lançamento e implementação das USF, assentes em equipas multiprofissionais, constituídas por especialistas em medicina geral e familiar, enfermeiros, administrativos e outros profissionais de saúde, com vista a uma prestação de cuidados de saúde mais próxima dos cidadãos e à reconfiguração dos novos centros de saúde como entidades enquadradoras dessas mesmas unidades;
Considerando que o processo de reestruturação dos centros de saúde deve efectuar-se de modo progressivo, flexível e consensual, optimizando os recursos disponíveis e tirando proveito das experiências acumuladas:

Nestes termos, no desenvolvimento das linhas orientadoras do Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio, determina-se o seguinte:

1 – É aprovado o Regulamento para Lançamento e Implementação das Unidades de Saúde Familiar, constante do anexo ao presente despacho, que dele faz parte integrante.

2 – O Regulamento referido no número anterior é revisto no prazo de seis meses.

Ministério da Saúde, 12 de Janeiro de 2006. – O Ministro da Saúde, António Fernando Correia de Campos.

ANEXO
REGULAMENTO PARA LANÇAMENTO E IMPLEMENTAÇÃO DAS UNIDADES DE SAÚDE FAMILIAR
Norma I
Conceito

Para efeitos do presente diploma, considera-se unidade de saúde familiar, adiante designada por USF, a célula organizacional elementar de prestação de cuidados de saúde individuais e familiares, constituída por uma equipa multiprofissional, com autonomia organizativa, funcional e técnica e integrada em rede com outras unidades funcionais do centro de saúde.

Norma II
Objecto

O presente Regulamento estabelece a disciplina de lançamento e implementação das USF, criadas pelo Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio, como unidades estruturantes dos centros de saúde a reconfigurar.

Norma III
Candidatura às USF

1 – A adesão ao modelo das USF por parte da equipa multiprofissional inicia-se com a apresentação voluntária de uma candidatura em formulário próprio, por via electrónica, através da página da Missão para os Cuidados de Saúde Primários (MCSP), onde se indicam, nomeadamente:

a) A constituição da equipa;
b) O coordenador da equipa e endereço electrónico;
c) A área geográfica de actuação;

d) O número de utentes inscritos, ou a inscrever, distribuído por idade e género;
e) Os compromissos relativos à prestação de cuidados;
f) O plano de acção; e
g) Outros elementos que a equipa entenda úteis para avaliação do projecto.

2 – De acordo com as incumbências previstas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 157/2005, de 12 de Outubro, em sede da administração regional de saúde (ARS) respectiva, a equipa regional de apoio e acompanhamento, em parceria com a agência de contratualização, aprecia os elementos carreados para o processo de candidatura e elabora, no prazo de 30 dias, o parecer que fundamenta o despacho da sua aceitação ou recusa, por parte da respectiva ARS, despacho que será proferido nos 15 dias seguintes.

3 – Após a aceitação da candidatura, a ARS deve desencadear os procedimentos adequados para que a USF inicie a sua actividade no prazo máximo de 60 dias.

4 – A precedência para a apreciação é estabelecida pela ordem cronológica de apresentação das candidaturas, por via electrónica.

5 – Será dada prioridade às candidaturas oriundas de projectos em curso nos cuidados de saúde primários – nomeadamente os projectos RRE (regime remuneratório experimental) – e com avaliação favorável pelas equipas regionais de apoio e acompanhamento.

Norma IV
Constituição da equipa multiprofissional

1 – A equipa multiprofissional deve potenciar as aptidões e competências de cada grupo profissional e contribuir para o estabelecimento de uma relação interpessoal e profissional estável.

2 – A equipa terá uma composição multiprofissional, integrando actividades de medicina geral e familiar, de enfermagem e administrativas, cuja dimensão se subordinará à população inscrita, de acordo com o disposto no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio (unidades de saúde familiar/listas de utentes), em articulação com o disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 117/98, de 5 de Maio (unidades ponderadas).

3 – A constituição da equipa mencionada nos números anteriores poderá ser alargada para integrar profissionais de outras áreas, em situações devidamente contratualizadas.

4 – O presente diploma aplica-se aos médicos especialistas em medicina geral e familiar, assim como aos restantes profissionais da saúde, independentemente do seu vínculo laboral com o Ministério da Saúde.

Norma V
Mobilidade profissional

1 – Para a constituição das equipas, os profissionais deverão agrupar-se com respeito pelas listas de utentes que estão atribuídas aos médicos integrantes da equipa.

2 – Os profissionais que integrem a equipa, quando fora do seu quadro de origem ou mapa de afectação, consideram-se em regime de mobilidade por destacamento.

3 – Quando se verifique que a mobilidade referida no número anterior pode provocar rupturas ou pôr em causa a prestação de cuidados aos cidadãos, a ARS deve solucionar o problema no prazo de 60 dias.

4 – A mobilidade é prioritária sempre que esteja em causa a formação de equipas que aumentem a cobertura assistencial à população sem médico de família.

Norma VI
Compromisso assistencial

1 – A equipa, de acordo com o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 157/99, compromete-se à prestação de cuidados de saúde de forma personalizada, garantindo a acessibilidade, a continuidade e a globalidade dos mesmos à população inscrita nas listas de utentes dos médicos especialistas em medicina geral e familiar que integram a USF.

2 – O compromisso assistencial, expresso no plano de acção para a USF, deve indicar:

a) A definição da oferta e compromisso assistencial (carteira básica de serviços);
b) Os horários de funcionamento da USF;
c) A definição do sistema de marcação, atendimento e orientação dos utentes;
d) A definição do sistema de renovação de prescrição;
e) A definição do sistema de intersubstituição dos profissionais;
f) A articulação com as outras unidades funcionais do centro de saúde;
g) A carteira de serviços adicionais, caso exista;
h) A aceitação expressa das condições, dimensão e modos de colheita de informação que permita às entidades autorizadas por despacho do Ministro da Saúde avaliar o desempenho da equipa e dos seus membros, em termos de efectividade, eficiência, qualidade e equidade.

3 – A carteira básica de serviços de saúde mencionada na alínea a) do número anterior será definida pela MCSP e estará disponível na sua página electrónica.

4 – O plano de acção deve também indicar:
a) A definição de objectivos e metas a atingir nas áreas de acessibilidade, continuidade, efectividade e produtividade;
b) O prazo para a elaboração de regulamento interno e de carta da qualidade para a USF.

5 – Os profissionais integrantes da equipa são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das obrigações assumidas e decorrentes do compromisso assistencial, designadamente a intersubstituição em períodos de ausência, inferiores ou iguais a duas semanas, e para gozo de férias.

6 – Nas ausências superiores a duas semanas, é observado o disposto no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 117/98, de 5 de Maio.

Norma VII
Níveis de desenvolvimento das USF

1 – A evolução das USF é organizada em cinco patamares ou níveis de desenvolvimento.

2 – A classificação de uma USF é determinada por cumprimento de critérios em três áreas de diferenciação:

a) Grau de autonomia funcional e técnica;
b) Diferenciação do modelo retributivo e de incentivos;
c) Modelo de financiamento.

3 – A lista de critérios e a metodologia que permitem classificar as USF em cinco níveis de desenvolvimento será elaborada pela MCSP, em articulação com as ARS e com o Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde (IGIF), e publicada na sua página electrónica.

Norma VIII
Regimes de trabalho e remuneratório

Na vigência deste diploma, até à aprovação de legislação própria, são adoptados os seguintes regimes de trabalho e remuneratórios:

1 – Ao pessoal médico é aplicado um dos seguintes regimes:

a) O regime previsto no Decreto-Lei n.º 117/98, de 5 de Maio, com os desenvolvimentos da Portaria n.º 993-A/98, de 24 de Novembro, e da circular normativa n.º 6/GAB-DG, de 10 de Abril de 2002, da Direcção-Geral da Saúde, no seu n.º 4;
b) O regime previsto no Decreto-Lei n.º 73/90, de 6 de Março.

2 – Ao pessoal de enfermagem, quando a carteira de serviços o recomende, aplicar-se-á o regime de trabalho de horário acrescido nos termos do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, e dos n.os 6.4.3 a 6.4.7 da circular normativa n.º 6/GAB-DG, de 10 de Abril de 2002, da Direcção-Geral da Saúde.

3 – Ao pessoal administrativo e outros profissionais será aplicada a estrutura das remunerações base das suas respectivas carreiras, bem como o regime de trabalho extraordinário, quando for caso disso, até ao limite previsto na lei.

4 – Em situações devidamente fundamentadas, para alargamento do período de cobertura assistencial ou para a execução de programas de saúde da responsabilidade do centro de saúde, poderão as equipas contratualizar uma carteira adicional de serviços, em regime de trabalho extraordinário, com observância dos limites previstos na lei.

5 – Aos profissionais aderentes às USF estão garantidos os direitos e regalias decorrentes das respectivas carreiras profissionais.

Norma IX
Avaliação e acompanhamento

1 – A MCSP desenvolverá até ao final de Janeiro de 2006, em conjunto com as agências de contratualização, os termos de referência para a contratualização e painel de indicadores de monitorização. Estes indicadores serão estruturados de acordo com as seguintes áreas:

a) Disponibilidade;

b) Acessibilidade;

c) Produtividade;

d) Qualidade técnico-científica;

e) Efectividade;

f) Eficiência;

g) Satisfação.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, as USF devem, desde já, adoptar o painel mínimo de indicadores utilizado na avaliação ao regime remuneratório experimental previsto no despacho n.º 5077/2004, de 13 de Março, do Ministro da Saúde.

3 – Cada ARS desenvolverá, em conjunto com a MCSP e as agências de contratualização, um modelo de avaliação das diversas USF que conduza:

a) À correcção e ajustamentos de eventuais desvios da implementação das USF;

b) À formulação de propostas seguras e adequadas de reconfiguração dos centros de saúde, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio.

4 – O modelo de avaliação deve ser gizado no sentido de uma uniformidade de critérios em todo o território nacional, com as necessárias adaptações às características de cada região.

5 – As ARS devem, até à reconfiguração dos novos centros de saúde, estabelecer as orientações necessárias à boa articulação entre as várias unidades funcionais dos actuais centros de saúde com vista à implementação da unidade de cuidados na comunidade e da unidade operativa de saúde pública, entre outras, dadas as significativas alterações nas estruturas organizativas dos centros de saúde com a implementação das USF.

Norma X
Condições de implantação das USF

1 – Cabe às ARS:

a) Assegurar a disponibilização e controlo dos meios financeiros necessários ao cumprimento do plano assumido;

b) Assegurar instalações, equipamentos e meios tecnológicos necessários à prossecução dos objectivos das equipas.

2 – Cabe às equipas regionais de apoio e acompanhamento:

a) Monitorizar o processo das candidaturas das diversas equipas e desenvolver actividade que assegure apoio à elaboração das candidaturas;

b) Acompanhar a elaboração e a implementação do plano anual de acção.

3 – A cada equipa multiprofissional incumbe a adopção e implementação de:

a) Uma base de dados credível e fiável dos ficheiros de utentes dos médicos aderentes;

b) Um sistema de informação que responda aos indicadores solicitados pela equipa regional de apoio e acompanhamento;

c) Um plano de desenvolvimento de competências e de formação.

4 – As ARS devem reformular a agência de contratualização, dotando-a com uma vertente destinada à área dos centros de saúde e unidades de saúde familiar.

Norma XI
Instalações e equipamentos

Na instalação das USF serão observadas as normas orientadoras, de âmbito nacional, sobre instalações, equipamento e humanização das USF, em preparação por grupo de trabalho especializado.

Norma XII
Treino, ensino e inovação

1 – As ARS podem protocolar com escolas de ensino superior, ou outras entidades, para que as USF que possuam idoneidade formativa constituam espaços privilegiados de investigação e formação, contribuindo, de forma decisiva, para a qualificação dos profissionais da saúde.

2 – As ARS, em articulação com orientações da MCSP, devem proporcionar programas de formação e desenvolvimento contínuo de competências das equipas das USF, tendo em vista a melhoria permanente dos serviços prestados, a racionalização e a efectividade do funcionamento da própria unidade, assim como a cooperação e partilha de conhecimentos, práticas e soluções na rede de USF com outras redes prestadoras de cuidados.