Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro
Na sequência das profundas alterações verificadas na composição e nas regras de funcionamento do sector empresarial do Estado ao longo dos últimos anos, procura-se com o presente diploma estabelecer um regime quadro aplicável às entidades que, hoje em dia, mais caracteristicamente integram tal sector.
A revisão do regime jurídico do sector empresarial do Estado segue-se à aprovação pela Assembleia da República de uma lei quadro das empresas públicas regionais e locais.
As soluções que agora se consagram são ditadas pela preocupação de criar um regime muito flexível, susceptível de poder abranger as diversas entidades que integram o sector empresarial do Estado e que deixaram de estar submetidas à disciplina do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril (lei de bases das empresas públicas), passando a actuar de harmonia com as regras normais do direito societário.
Essa é, aliás, a linha essencial do presente diploma, que consagra o direito privado como o direito aplicável por excelência a toda a actividade empresarial, seja ela pública ou privada.
Não se esquece, no entanto, que os estatutos das diferentes empresas consagram já, por vezes, excepções ao regime do direito das sociedades, prática que expressamente se legitima e admite dever continuar a ser utilizada.
A circunstância de, hoje em dia, apenas estar sujeito ao Decreto-Lei n.º 260/76 um grupo muito reduzido de empresas e a inadequação de tal diploma às actuais condições de desenvolvimento da actividade das empresas públicas aconselharam, por outro lado, a sua revogação.
O presente diploma procede, aliás, em obediência à lei de autorização, à redefinição do conceito de empresa pública, aproximando-o daquele que lhe é fornecido no direito comunitário, opção que implica um significativo aumento do universo das empresas abrangidas.
A extensão do universo regulado neste diploma e a variedade das figuras jurídicas que o integram determinaram, em qualquer caso, que se procurasse criar um regime geral que contemple diversas soluções.
Admitir-se-ia, eventualmente, que a revisão do conceito pudesse levar à exclusão total de formas especiais de organização, como são as actuais empresas públicas reguladas pelo Decreto-Lei n.º 260/76. Entendeu-se, no entanto, que se poderia continuar a justificar a existência de entidades empresariais de natureza pública, que se integrarão no regime geral agora estabelecido, nos termos do capítulo III.
Estas empresas continuarão a reger-se também elas em múltiplos aspectos pelo direito privado, mas ficarão sujeitas a um regime de tutela, ainda que mais aliviado do que o previsto no anterior diploma.
Naturalmente que em relação às entidades do sector empresarial que se revestem já da forma de sociedades comerciais se não prevê a subsistência da tutela governamental nos mesmos termos, procurando, no entanto, encontrar-se soluções que possam contribuir para uma maior eficácia do sector empresarial do Estado.
A experiência parece mostrar, de facto, que a simples remissão para o regime de direito privado não tem sido suficiente para assegurar uma correcta articulação entre as várias unidades do sector empresarial e o Estado accionista. No presente diploma procura-se responder a este problema basicamente através do reforço das obrigações de informação e prevendo-se a aprovação de orientações estratégicas de gestão que serão transmitidas a essas empresas.
Prevê-se, por outro lado, a manutenção dos actuais mecanismos de acompanhamento e controlo que poderão, todavia, ser exercidos em condições mais efectivas.
Constituiu preocupação essencial subjacente ao presente diploma o acompanhamento das mais recentes orientações relativas ao enquadramento das empresas públicas no âmbito da União Europeia, designadamente quanto à sua sujeição aos normativos de direito da concorrência, sem prejuízo das funções especiais que sejam cometidas no plano nacional ao sector empresarial do Estado.
Assim, tomaram-se em consideração as interpretações que vêm prevalecendo na prática decisória dos órgãos comunitários relativamente aos artigos 85.º, 86.º, 90.º e 92.º do Tratado de Roma (artigos 81.º, 82.º 86.º e 87.º, de acordo com as alterações a introduzir pelo Tratado de Amsterdão), no sentido de afastar à partida quaisquer hipotéticas questões de compatibilidade do novo regime nacional com o ordenamento comunitário.
Na realidade, as tendências de fundo neste domínio afirmam uma sujeição da generalidade das empresas públicas às normas de concorrência e a necessidade de afastar quaisquer distorções da concorrência especialmente emergentes do conteúdo e forma das relações entre o Estado e outros entes públicos e as empresas públicas que controlam.
Em contrapartida, pretendeu-se salvaguardar, no plano nacional, um conjunto de situações especiais – justificativas de derrogações ao regime geral aplicável às empresas públicas e ao princípio da sua plena sujeição às normas de concorrência – relacionado com a prossecução dos denominados serviços de interesse económico geral por parte de empresas públicas.
Um lugar à parte é ocupado pelas empresas que exploram serviços de interesse económico geral, reguladas no capítulo II, que consagra algumas soluções que levam em atenção a sua especial importância para o conjunto dos consumidores e para a própria coesão social.
Sem prejuízo de se tomarem em consideração diversos aspectos contemplados no projecto de carta europeia de serviço público do Centro Europeu de Empresas Públicas (CEEP), evitou-se deliberadamente qualquer tipificação exaustiva dessas categorias de serviços de interesse económico geral, por se afigurar solução demasiado limitativa e rígida.
Teve-se presente, designadamente, o princípio geral introduzido pelo Tratado de Amsterdão, através do novo artigo 7.º-D (inserido no Tratado que Institui a Comunidade Europeia), no sentido de que «a Comunidade e os seus Estados membros, dentro do limite das respectivas competências […], zelarão por que esses serviços funcionem com base em princípios e em condições que lhes permitam cumprir as suas missões».
Foi também conferida a devida e necessária atenção ao princípio da transparência das relações financeiras entre o Estado e entes públicos e as empresas públicas que detenham, tendo presente, designadamente, as orientações comunitárias nesta matéria decorrentes da Directiva n.º 80/723/CEE, de 29 de Julho, alterada, no sentido da clarificação e reforço das imposições de transparência financeira, pela Directiva n.º 93/84/CEE, de 30 de Setembro.
O capítulo III ocupa-se do protótipo de empresa pública, como o moldou o Decreto-Lei n.º 260/76, enquanto pessoa colectiva de direito público.
O propósito essencial neste conjunto de disposições é simplificar quanto possível o estatuto legal dessa forma empresarial que traduz a manifestação mais apurada da iniciativa económica pública.
Não se vai ao ponto de inovar por inteiro quanto a um regime específico destas entidades, designadamente de criação e extinção (artigos 24.º e 34.º), sendo, aliás, mantida na denominação social a expressão ou sigla própria (EP), nem quanto à sujeição à tutela governamental.
Abandona-se, no entanto, a regulamentação pormenorizada, com carácter geral, de várias matérias cujo regime poderá com vantagem ser aquilatado em face das circunstâncias da cada caso – e que, por isso, é relegado expressamente, agora, ou para diploma especial, ou para os estatutos individuais das empresas (estes, de resto, também aprovados por decreto-lei).
Como já foi referido, aproxima-se, em toda a medida possível, o regime destas entidades públicas do paradigma jurídico-privado das restantes empresas. Salientem-se, a este propósito, não só a definição da própria orgânica das empresas (artigo 27.º) e a sua sujeição ao registo comercial (artigo 28.º) mas desde logo a regulação subsidiária da respectiva actividade pelo direito privado (artigo 23.º).
O diploma que agora se aprova é naturalmente apenas um primeiro passo na revisão do regime jurídico do sector empresarial do Estado, que deverá ser completado com outras alterações legislativas e, designadamente, com a revisão do estatuto do gestor público.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprios das Regiões Autónomas e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Assim, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 47/99, de 16 de Junho, e nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
SECÇÃO I
Sector empresarial do Estado e empresas públicas
Artigo 1.º
Objecto
1 – O presente diploma tem por objecto estabelecer o regime do sector empresarial do Estado, incluindo as bases gerais do estatuto das empresas públicas do Estado.
2 – O regime previsto no presente diploma aplica-se ainda às empresas detidas, directa ou indirectamente, por todas as entidades públicas estaduais.
Artigo 2.º
Sector empresarial do Estado
1 – O sector empresarial do Estado integra as empresas públicas, nos termos do artigo 3.º, e as empresas participadas.
2 – Empresas participadas são as organizações empresariais que tenham uma participação permanente do Estado ou de quaisquer outras entidades públicas estaduais, de carácter administrativo ou empresarial, por forma directa ou indirecta, desde que o conjunto das participações públicas não origine qualquer das situações previstas no n.º 1 do artigo 3.º
3 – Consideram-se participações permanentes as que não tenham objectivos exclusivamente financeiros, sem qualquer intenção de influenciar a orientação ou a gestão da empresa por parte das entidades participantes, desde que a respectiva titularidade não atinja uma duração, contínua ou interpolada, superior a um ano.
4 – Presume-se a natureza permanente das participações sociais representativas de mais de 10% do capital social da entidade participada, com excepção daquelas que sejam detidas por empresas do sector financeiro.
Artigo 3.º
Empresas públicas
1 – Consideram-se empresas públicas as sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias:
a) Detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto;
b) Direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização.
2 – São também empresas públicas as entidades com natureza empresarial reguladas no capítulo III.
Artigo 4.º
Missão das empresas públicas e do sector empresarial do Estado
A actividade das empresas públicas e o sector empresarial do Estado devem orientar-se no sentido de contribuir para o equilíbrio económico e financeiro do conjunto do sector público e para a obtenção de níveis adequados de satisfação das necessidades da colectividade.
Artigo 5.º
Sectores empresariais regionais e municipais
Além do Estado, apenas dispõem de sectores empresariais próprios as Regiões Autónomas, os municípios e as suas associações, nos termos de legislação especial, relativamente à qual o presente diploma tem natureza supletiva.
Artigo 6.º
Enquadramento das empresas participadas
1 – Sem prejuízo das autonomias atribuídas às entidades públicas estaduais, de carácter administrativo ou empresarial, detentoras de participações, ou reconhecidas às Regiões Autónomas, aos municípios e às suas associações, uma empresa participada por diversas entidades públicas integra-se no sector empresarial da entidade que, no conjunto das participações do sector público, seja titular da maior participação relativa.
2 – A integração das empresas participadas no sector empresarial do Estado aplica-se apenas à respectiva participação pública e aos representantes da entidade participante, nomeadamente quanto ao estatuto dos gestores, à gestão, directamente ou através das sociedades gestoras a que se refere o n.º 3 do artigo 10.º, ao registo de participações, ao exercício dos direitos de accionista e ao controlo das participações públicas.
SECÇÃO II
Direito aplicável
Artigo 7.º
Regime jurídico geral
1 – Sem prejuízo do disposto na legislação aplicável às empresas públicas regionais, intermunicipais e municipais, as empresas públicas regem-se pelo direito privado, salvo no que estiver disposto no presente diploma e nos diplomas que tenham aprovado os respectivos estatutos.
2 – As empresas públicas estão sujeitas a tributação directa e indirecta, nos termos gerais.
3 – As empresas participadas estão plenamente sujeitas ao regime jurídico comercial, laboral e fiscal, ou de outra natureza, aplicável às empresas cujo capital e controlo é exclusivamente privado.
Artigo 8.º
Sujeição às regras da concorrência
1 – As empresas públicas estão sujeitas às regras gerais de concorrência, nacionais e comunitárias.
2 – Das relações entre empresas públicas e o Estado ou outros entes públicos não poderão resultar situações que, sob qualquer forma, sejam susceptíveis de impedir, falsear ou restringir a concorrência no todo ou em parte do território nacional.
3 – As empresas públicas regem-se pelo princípio da transparência financeira e a sua contabilidade deve ser organizada de modo a permitir a identificação de quaisquer fluxos financeiros entre elas e o Estado ou outros entes públicos, bem como garantir o cumprimento das exigências nacionais e comunitárias em matéria de concorrência e auxílios públicos.
Artigo 9.º
Derrogações
O disposto nos n.os 1 e 2 do artigo anterior não prejudica regimes derrogatórios especiais, devidamente justificados, sempre que a aplicação das normas gerais de concorrência seja susceptível de frustrar, de direito ou de facto, as missões confiadas às empresas públicas incumbidas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que apoiem a gestão do património do Estado.
SECÇÃO III
Outras disposições
Artigo 10.º
Função accionista do Estado
1 – Os direitos do Estado como accionista são exercidos através da Direcção-Geral do Tesouro, sob a direcção do Ministro das Finanças, que poderá delegar, em conformidade com as orientações estratégicas previstas no artigo seguinte e mediante a prévia coordenação estratégica sectorial estabelecida com os ministros responsáveis pelo sector.
2 – Os direitos de outras entidades públicas estaduais como accionista são exercidos pelos órgãos de gestão respectivos, com respeito pelas orientações decorrentes da superintendência e pela tutela que sobre elas sejam exercidas.
3 – Os direitos referidos nos números anteriores poderão ser exercidos indirectamente, através de sociedades gestoras de participações sociais, cujas acções sejam detidas pelo Estado e ou por entidades de direito público ou de capitais exclusiva ou maioritariamente públicos.
Artigo 11.º
Orientações estratégicas
1 – Sob proposta do Ministro das Finanças e do ministro responsável pelo sector, o Conselho de Ministros definirá orientações estratégicas relativas ao exercício da função accionista nas empresas referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 3.º, as quais serão revistas, pelo menos, com referência ao período de duração do mandato da administração fixado pelos respectivos estatutos.
2 – As orientações estratégicas referidas no número anterior poderão envolver metas quantificadas e contemplar a celebração de contratos entre o Estado e as empresas públicas e reflectir-se-ão nas orientações anuais definidas em assembleia geral e nos contratos de gestão a celebrar com os gestores.
3 – Compete ao Ministro das Finanças e ao ministro responsável pelo sector, que poderão delegar, directamente ou através das sociedades gestoras de participações sociais previstas no n.º 3 do artigo anterior, a verificação do cumprimento dessas orientações estratégicas, podendo emitir recomendações para a sua prossecução.
Artigo 12.º
Controlo financeiro
1 – As empresas públicas ficam sujeitas a controlo financeiro destinado a averiguar da legalidade, economia, eficiência e eficácia da sua gestão.
2 – Sem prejuízo das competências atribuídas pela lei ao Tribunal de Contas, o controlo financeiro das empresas públicas compete à Inspecção-Geral de Finanças.
3 – As empresas públicas adoptarão procedimentos de controlo interno adequados a garantir a fiabilidade das contas e demais informação financeira, bem como a articulação com as entidades referidas no número anterior.
Artigo 13.º
Deveres especiais de informação
1 – Sem prejuízo do disposto na lei comercial quanto à prestação de informações aos accionistas, devem as empresas públicas facultar ao Ministério das Finanças e ao ministro responsável pelo respectivo sector, directamente ou através das sociedades gestoras de participações sociais previstas no n.º 3 do artigo 10.º, os seguintes elementos, visando o seu acompanhamento e controlo:
a) Projectos dos planos de actividades anuais e plurianuais;
b) Projectos dos orçamentos anuais, incluindo estimativa das operações financeiras com o Estado;
c) Documentos de prestação anual de contas;
d) Relatórios trimestrais de execução orçamental;
e) Quaisquer outras informações e documentos solicitados para o acompanhamento da situação da empresa e da sua actividade, com vista, designadamente, a assegurar a boa gestão dos fundos públicos e a evolução da sua situação económico-financeira.
2 – As informações abrangidas pelo número anterior serão prestadas pelas empresas públicas nas condições que vierem a ser estabelecidas por despacho do Ministro das Finanças, nos casos previstos nas alíneas b), c) e d) do número anterior, e por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do ministro responsável pelo sector, nos casos previstos nas alíneas a) e e) do mesmo número.
Artigo 14.º
Poderes de autoridade
1 – Poderão as empresas públicas exercer poderes e prerrogativas de autoridade de que goza o Estado, designadamente quanto a:
a) Expropriação por utilidade pública;
b) Utilização, protecção e gestão das infra-estruturas afectas ao serviço público;
c) Licenciamento e concessão, nos termos da legislação aplicável à utilização do domínio público, da ocupação ou do exercício de qualquer actividade nos terrenos, edificações e outras infra-estruturas que lhe estejam afectas.
2 – Os poderes especiais serão atribuídos por diploma legal, em situações excepcionais e na medida do estritamente necessário à prossecução do interesse público, ou constarão de contrato de concessão.
Artigo 15.º
Administradores designados ou propostos pelo Estado
1 – Os administradores designados ou propostos pelo Estado terão estatuto próprio, a definir por legislação especial.
2 – Os administradores devem ser escolhidos entre pessoas com experiência profissional relevante e que ofereçam garantias de um desempenho idóneo.
3 – Sem prejuízo das obrigações definidas no presente diploma ou em legislação especial, os administradores disporão de independência técnica no exercício das suas funções.
4 – Os membros dos órgãos sociais das sociedades gestoras de participações sociais a que se refere o n.º 3 do artigo 10.º e cujas acções sejam detidas exclusivamente pelo Estado são designados por resolução do Conselho de Ministros, que substitui, para todos os efeitos, a eleição em assembleia geral.
Artigo 16.º
Estatuto do pessoal
1 – O estatuto do pessoal das empresas públicas é o do regime do contrato individual de trabalho.
2 – A matéria relativa à contratação colectiva rege-se pela lei geral.
Artigo 17.º
Cedência de interesse público
1 — Os trabalhadores com relação jurídica de emprego público podem exercer funções nas empresas públicas por acordo de cedência de interesse público, nos termos da Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de Fevereiro.
2 — Os trabalhadores das empresas públicas podem exercer funções em órgãos ou serviços abrangidos pelo âmbito de aplicação da Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de Fevereiro, com utilização da modalidade adequada de constituição da relação jurídica de emprego público, por acordo de cedência de interesse público, nos termos daquela lei.
3 — Os trabalhadores referidos no número anterior podem optar pela retribuição base de origem.
Redacção introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31.12
Artigo 17.º-A
Comissão de serviço
1 — Os trabalhadores das empresas públicas podem exercer, em comissão de serviço, funções de carácter específico em outras empresas públicas, mantendo todos os direitos inerentes ao seu estatuto profissional na empresa de origem, incluindo os benefícios de reforma e sobrevivência, considerando -se todo o período da comissão como serviço prestado na empresa de origem.
2 — Os trabalhadores referidos no número anterior podem optar pela retribuição base de origem.
3 — A retribuição e demais encargos dos trabalhadores em comissão de serviço são da responsabilidade da entidade onde se encontrem a exercer funções.
Artigo aditado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31.12
Artigo 18.º
Tribunais competentes
1 – Para efeitos de determinação da competência para julgamento dos litígios, incluindo recursos contenciosos, respeitantes a actos praticados e a contratos celebrados no exercício dos poderes de autoridade a que se refere o artigo 14.º, serão as empresas públicas equiparadas a entidades administrativas.
2 – Nos demais litígios seguem-se as regras gerais de determinação da competência material dos tribunais.
CAPÍTULO II
Empresas públicas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral
Artigo 19.º
Noção
1 – Para efeitos do presente diploma, são consideradas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral aquelas cujas actividades devam assegurar a universalidade e continuidade dos serviços prestados, a coesão económica e social e a protecção dos consumidores, sem prejuízo da eficácia económica e do respeito dos princípios de não discriminação e transparência.
2 – Salvo quando a lei dispuser diversamente, os termos em que a gestão é atribuída e exercida constarão de contrato de concessão.
Artigo 20.º
Princípios orientadores
As empresas públicas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral devem prosseguir as missões que lhe estejam confiadas no sentido, consoante os casos, de:
a) Prestar os serviços de interesse económico geral no conjunto do território nacional, sem discriminação das zonas rurais e do interior;
b) Promover o acesso da generalidade dos cidadãos, em condições financeiras equilibradas, a bens e serviços essenciais, procurando, na medida do possível, que todos os utilizadores tenham direito a tratamento idêntico e neutro, sem quaisquer discriminações, quer quanto ao funcionamento dos serviços, quer quanto a taxas ou contraprestações devidas, a menos que o interesse geral o justifique;
c) Assegurar o cumprimento das exigências de prestação de serviços de carácter universal relativamente a actividades económicas cujo acesso se encontre legalmente vedado a empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza;
d) Garantir o fornecimento de serviços ou a gestão de actividades cuja rendibilidade não se encontra assegurada, em especial devido aos investimentos necessários ao desenvolvimento de infra-estruturas ou redes de distribuição ou, ainda, devido à necessidade de realizar actividades comprovadamente deficitárias;
e) Zelar pela eficácia da gestão das redes de serviços públicos, procurando, designadamente, que a produção, o transporte e distribuição, a construção de infra-estruturas e a prestação do conjunto de tais serviços se procedam de forma articulada, tendo em atenção as modificações organizacionais impostas por inovações técnicas ou tecnológicas;
f) Cumprir obrigações específicas, relacionadas com a segurança, com a continuidade e qualidade dos serviços e com a protecção do ambiente, devendo tais obrigações ser claramente definidas, transparentes, não discriminatórias e susceptíveis de controlo.
Artigo 21.º
Contratos com o Estado
1 – Para realização das finalidades previstas no artigo anterior poderá o Estado recorrer à celebração de contratos com as empresas públicas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, contemplando, designadamente, a atribuição de indemnizações compensatórias na medida do estritamente necessário à prossecução do interesse público.
2 – Estes contratos visarão assegurar a adaptação permanente à evolução das circunstâncias, inclusive técnicas e tecnológicas, e à satisfação das necessidades colectivas, conciliando a eficácia económica dos operadores com a manutenção da coesão social e a luta contra a exclusão.
3 – Os contratos a que se refere o presente artigo, que envolvam a assunção de obrigações ou de compromissos financeiros por parte do Estado ou de outras entidades públicas, deverão prever a respectiva quantificação e validação, cabendo aos serviços competentes do Ministério das Finanças a emissão de parecer prévio à sua celebração, bem como o acompanhamento geral da execução das suas cláusulas financeiras.
4 – O regime das indemnizações compensatórias consta de decreto-lei especial.
Artigo 22.º
Participação dos utentes
1 – O Estado promoverá o desenvolvimento de formas de concertação com os utentes ou organizações representativas destes, bem como da sua participação na definição dos objectivos das empresas públicas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral.
2 – O direito de participação dos utentes na definição dos objectivos das empresas públicas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral será regulado por decreto-lei.
CAPÍTULO III
Entidades públicas empresariais
Artigo 23.º
Âmbito de aplicação
1 – Regem-se pelas disposições do presente capítulo e, subsidiariamente, pelas restantes normas deste diploma as pessoas colectivas de direito público, com natureza empresarial, criadas pelo Estado e doravante designadas por «entidades públicas empresariais».
2 – O disposto no número anterior é aplicável às empresas públicas a que se refere o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril, existentes à data da entrada em vigor do presente diploma, as quais passam a adoptar a designação prevista no final do número anterior.
Artigo 24.º
Criação
1 – As entidades públicas empresariais são criadas por decreto-lei, o qual aprovará também os respectivos estatutos.
2 – A denominação das entidades públicas empresariais deve integrar a expressão «Entidade Pública Empresarial» ou as iniciais «E. P. E.».
Artigo 25.º
Autonomia e capacidade jurídica
1 – As entidades públicas empresariais são dotadas de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, não estando sujeitas às normas da contabilidade pública.
2 – A capacidade jurídica das entidades públicas empresariais abrange todos os direitos e obrigações necessários ou convenientes à prossecução do seu objecto.
Artigo 26.º
Capital
1 – As entidades públicas empresariais terão um capital, designado «capital estatutário», detido pelo Estado ou por outras entidades públicas e destinado a responder às respectivas necessidades permanentes.
2 – O capital estatutário poderá ser aumentado ou reduzido nos termos previstos nos estatutos.
Artigo 27.º
Órgãos
1 – A administração e a fiscalização das entidades públicas empresariais devem estruturar-se segundo as modalidades e com as designações previstas para as sociedades anónimas.
2 – Os órgãos de administração e fiscalização têm as competências genéricas previstas na lei comercial, sem prejuízo do disposto no presente diploma.
3 – Os estatutos podem prever a existência de outros órgãos, deliberativos ou consultivos, definindo as respectivas competências.
4 – Os estatutos regularão, com observância das normas legais aplicáveis, a competência e o modo de designação dos membros dos órgãos a que se referem os números anteriores.
Artigo 28.º
Registo comercial
As entidades públicas empresariais estão sujeitas ao registo comercial nos termos gerais, com as adaptações que se revelem necessárias.
Artigo 29.º
Tutela
1 – A tutela económica e financeira das entidades públicas empresariais é exercida pelo Ministro das Finanças e pelo ministro responsável pelo sector de actividade de cada empresa, sem prejuízo do respectivo poder de superintendência.
2 – A tutela abrange:
a) A aprovação dos planos estratégico e de actividades, orçamentos e contas, assim como de dotações para capital, subsídios e indemnizações compensatórias;
b) A homologação de preços ou tarifas a praticar por empresas que explorem serviços de interesse económico geral ou exerçam a respectiva actividade em regime de exclusivo, salvo quando a sua definição competir a outras entidades independentes;
c) Os demais poderes expressamente referidos nos estatutos.
Artigo 30.º
Regime especial de gestão
1 – Em circunstâncias excepcionais devidamente justificadas, podem as entidades públicas empresariais ser sujeitas a um regime especial de gestão, por prazo determinado que não exceda dois anos, em condições fixadas mediante resolução do Conselho de Ministros.
2 – A resolução prevista no número anterior determina a cessação automática das funções dos titulares dos órgãos de administração em exercício.
Artigo 31.º
Plano de actividades e orçamento anual
1 – As entidades públicas empresariais prepararão para cada ano económico o plano de actividades e o orçamento, os quais deverão ser completados com os desdobramentos necessários para permitir a descentralização de responsabilidades e o adequado controlo de gestão.
2 – Os projectos do plano de actividades e do orçamento anual serão elaborados com respeito pelos pressupostos macroeconómicos, pelas orientações estratégicas previstas no artigo 11.º e pelas directrizes definidas pelo Governo, bem como, quando for caso disso, por contratos de gestão ou por contratos-programa, e deverão ser remetidos para aprovação, até 30 de Novembro do ano anterior, ao Ministério das Finanças e ao ministério que supervisiona o respectivo sector de actividade.
Artigo 32.º
Prestação de contas
As entidades públicas empresariais devem elaborar, com referência a 31 de Dezembro do ano anterior, os documentos de prestação de contas, remetendo-os, nos prazos em que nas sociedades anónimas se deve proceder à disponibilização das contas aos accionistas, à Inspecção-Geral de Finanças que, após parecer, os submeterá à apreciação do Ministro das Finanças e do ministro que supervisiona o respectivo sector de actividade.
Artigo 33.º
Transformação, fusão e cisão
A transformação das entidades públicas empresariais bem como a respectiva fusão ou cisão operam-se, em cada caso, através de decreto-lei e nos termos especiais nele estabelecidos.
Artigo 34.º
Extinção
1 – Pode ser determinada por decreto-lei a extinção de entidades públicas empresariais, bem como o subsequente processo de liquidação.
2 – Não são aplicáveis as regras gerais sobre dissolução e liquidação de sociedades, nem as dos processos especiais de recuperação e falência, salvo na medida do expressamente determinado pelo decreto-lei referido no número anterior.
CAPÍTULO IV
Disposições finais e transitórias
Artigo 35.º
Adaptação dos estatutos
1 – O Governo adaptará ao regime definido no capítulo III, ate 31 de Dezembro de 2000, os estatutos das empresas públicas a que se refere o n.º 2 do artigo 23.º e os estatutos dos fundos e serviços autónomos de carácter empresarial.
2 – No mesmo prazo, serão adaptados ao presente diploma os estatutos das restantes empresas públicas.
Artigo 36.º
Extensão a outras entidades
1 – Os direitos de accionista do Estado ou de outras entidades públicas estaduais a que se refere o presente diploma, nas sociedades em que, mesmo conjuntamente, não detenham influência dominante são exercidos, respectivamente, pela Direcção-Geral do Tesouro ou pelos órgãos de gestão das entidades titulares.
2 – As sociedades em que o Estado exerça uma influência significativa, seja por detenção de acções que representam mais de 10% do capital social, seja por detenção de direitos especiais de accionista, deverão apresentar na Direcção-Geral do Tesouro a informação destinada aos accionistas, nas datas em que a estes deva ser disponibilizada, nos termos da legislação aplicável às sociedades comerciais.
3 – Os direitos referidos nos números anteriores poderão ser exercidos, indirectamente, nos termos previstos no n.º 3 do artigo 10.º
4 – Às empresas privadas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, por força de concessão ou da atribuição de direitos especiais ou exclusivos, é aplicável o disposto nos artigos 9.º, 12.º e 13.º e no capítulo II do presente diploma.
5 – Podem ser sujeitas ao regime estabelecido no presente diploma, no todo ou em parte, com excepção do constante do seu capítulo III, as empresas nas quais o Estado ou outras entidades públicas disponham de direitos especiais, desde que os respectivos estatutos assim o prevejam.
Artigo 37.º
Constituição de sociedade ou aquisição de novas partes de capital
A participação do Estado ou de outras entidades públicas estaduais na constituição de sociedades ou na aquisição de partes de capital está sujeita a autorização do Ministro das Finanças, excepto nas aquisições que decorram de dação em cumprimento, doação, renúncia ou abandono.
Artigo 38.º
Orientações estratégicas e contratos de gestão
1 – Por ocasião das assembleias gerais ordinárias realizadas no ano de 2000 serão aprovadas as primeiras orientações estratégicas a que se refere o artigo 11.º
2 – Durante o ano de 2000 celebrar-se-ão com os gestores contratos de gestão envolvendo metas quantificadas.
Artigo 39.º
Estatuto dos gestores públicos
Até ser aprovada a legislação prevista no artigo 15.º mantém-se em vigor o regime do estatuto dos gestores públicos, constante do Decreto-Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro.
Artigo 40.º
Revogação
1 – É revogado o Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril, com as alterações que lhe foram introduzidas.
2 – As remissões constantes de quaisquer diplomas, legais ou regulamentares, para o regime do Decreto-Lei n.º 260/76 entendem-se feitas para as disposições do capítulo III, sem prejuízo da aplicação, quando for o caso, das demais disposições previstas no presente diploma.
Artigo 41.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no 1.º dia do mês subsequente ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 23 de Setembro de 1999. – António Manuel de Oliveira Guterres – António Luciano Pacheco de Sousa Franco – João Cardona Gomes Cravinho – José Eduardo Vera Cruz Jardim – Joaquim Augusto Nunes de Pina Moura – Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira – António Luís Santos da Costa – José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Promulgado em 30 de Novembro de 1999.
Publique-se.
O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 8 de Dezembro de 1999.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.