Lei n.º 46/2004, de 19 de Agosto
Aprova o regime jurídico aplicável à realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objecto e âmbito
1 – A presente lei transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2001/20/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Abril, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados membros respeitantes à aplicação de boas práticas clínicas na condução dos ensaios clínicos de medicamentos para uso humano, e estabelece o regime jurídico da realização de ensaios clínicos em seres humanos com a utilização de medicamentos de uso humano.
2 – A presente lei não se aplica aos ensaios sem intervenção, os quais são objecto de regulamentação própria.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do disposto nesta lei, entende-se por:
a) «Ensaio ou ensaio clínico» qualquer investigação conduzida no ser humano, destinada a descobrir ou verificar os efeitos clínicos, farmacológicos ou os outros efeitos farmacodinâmicos de um ou mais medicamentos experimentais, ou identificar os efeitos indesejáveis de um ou mais medicamentos experimentais, ou a analisar a absorção, a distribuição, o metabolismo e a eliminação de um ou mais medicamentos experimentais, a fim de apurar a respectiva segurança ou eficácia;
b) «Centro de ensaio» o local de realização de ensaio em estabelecimento de saúde, público ou privado, laboratório ou outra entidade dotada dos meios materiais e humanos adequados à realização de um ensaio clínico, situado no território nacional ou no território de qualquer Estado membro da União Europeia ou de um Estado terceiro;
c) «Ensaio clínico multicêntrico» o ensaio clínico realizado de acordo com um único protocolo, em mais de um centro de ensaio e, consequentemente, por dois ou mais investigadores;
d) «Ensaio sem intervenção» o estudo no âmbito do qual os medicamentos são prescritos de acordo com as condições previstas na autorização de introdução no mercado desde que a inclusão do participante numa determinada estratégia terapêutica não seja previamente fixada por um protocolo de ensaio, mas dependa da prática corrente; a decisão de prescrever o medicamento esteja claramente dissociada da decisão de incluir ou não o participante no estudo; não seja aplicado aos participantes qualquer outro procedimento complementar de diagnóstico ou de avaliação, e sejam utilizados métodos epidemiológicos para analisar os dados recolhidos;
e) «Medicamento experimental» a forma farmacêutica de uma substância activa ou placebo, testada ou utilizada como referência num ensaio clínico, incluindo os medicamentos cuja introdução no mercado haja sido autorizada, mas sejam utilizados ou preparados, quanto à forma farmacêutica ou acondicionamento, de modo diverso da forma autorizada, ou sejam utilizados para uma indicação não autorizada ou destinados a obter mais informações sobre a forma autorizada;
f) «Boas práticas clínicas» o conjunto de requisitos de qualidade, em termos éticos e científicos, reconhecidos a nível internacional, que devem ser respeitados na concepção, na realização, no registo e na notificação dos ensaios clínicos que envolvam a participação de seres humanos, e cuja observância constitui uma garantia de protecção dos direitos, da segurança e do bem-estar dos participantes nos ensaios clínicos, bem como da credibilidade desses ensaios;
g) «Promotor» a pessoa, singular ou colectiva, instituto ou organismo responsável pela concepção, realização, gestão ou financiamento de um ensaio clínico;
h) «Monitor» o profissional, dotado da necessária competência científica ou clínica, designado pelo promotor para acompanhar o ensaio clínico e para o manter permanentemente informado, relatando a sua evolução e verificando as informações e dados coligidos;
i) «Investigador» um médico ou uma outra pessoa que exerça profissão reconhecida em Portugal para o exercício da actividade de investigação, devido às habilitações científicas e à experiência na prestação de cuidados a doentes que a mesma exija, que se responsabiliza pela realização do ensaio clínico no centro de ensaio e, sendo caso disso, pela equipa que executa o ensaio nesse centro; neste caso, pode ser designado investigador principal;
j) «Investigador-coordenador» o investigador responsável pela coordenação de todos os investigadores de todos os centros de ensaio nacionais que participam num ensaio clínico multicêntrico;
l) «Brochura do investigador» a compilação dos dados clínicos e não clínicos relativos ao(s) medicamento(s) experimental(ais) pertinentes para o estudo desse ou desses medicamentos no ser humano;
m) «Protocolo» o documento que descreve os objectivos, a concepção, a metodologia, os aspectos estatísticos e a organização de um ensaio, incluindo as versões sucessivas e as alterações daquele documento;
n) «Participante» a pessoa que participa no ensaio clínico quer como receptor do medicamento experimental quer para efeitos de controlo;
o) «Consentimento livre e esclarecido» a decisão, expressa mediante declaração obrigatoriamente reduzida a escrito, datada e assinada, de participar num ensaio clínico, tomada livremente por uma pessoa dotada de capacidade para dar o seu consentimento ou, na falta daquela capacidade, pelo seu representante legal, após ter sido devidamente informada sobre a natureza, o alcance, as consequências e os riscos do ensaio e ter recebido documentação adequada; excepcionalmente, se o declarante não estiver em condições de dar o seu consentimento por escrito, este pode ser dado oralmente, na presença de duas testemunhas;
p) «Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC)» o organismo independente constituído por profissionais de saúde e outros, incumbido de assegurar a protecção dos direitos, da segurança e do bem-estar dos participantes nos ensaios clínicos e de garantir a mesma junto do público, a quem compete, em regra, emitir o parecer único;
q) «Comissões de ética para a saúde (CES)» as entidades criadas pelo Decreto-Lei n.º 97/95, de 10 de Maio, às quais compete, sempre que solicitadas pela CEIC, emitir o parecer previsto na presente lei;
r) «Comissão de ética competente (CEC)» a comissão encarregue de emissão do parecer único previsto na presente lei, quer se trate da CEIC, quer se trate de uma CES designada pela CEIC para esse fim;
s) «Inspecção» a actividade que consiste no controlo oficial dos documentos, instalações, registos, sistemas de garantia de qualidade e quaisquer outros elementos que sejam pela autoridade competente considerados relacionados com o ensaio clínico, independentemente de se encontrarem no centro de ensaio, nas instalações do promotor ou do organismo de investigação contratado, ou em qualquer outro estabelecimento cuja inspecção seja considerada necessária;
t) «Acontecimento adverso» qualquer manifestação nociva registada num doente ou num participante tratado por um medicamento, independentemente da existência de relação causal com o tratamento;
u) «Reacção adversa» qualquer manifestação nociva e indesejada registada a um medicamento experimental num doente ou participante no decurso do ensaio clínico, independentemente da dose administrada;
v) «Acontecimento adverso grave ou reacção adversa grave» a manifestação que, independentemente da dose administrada, provoque a morte, ponha em perigo a vida do participante, requeira a hospitalização ou o prolongamento da hospitalização, resulte em deficiência ou incapacidade significativas ou duradouras ou se traduza em anomalia ou malformação congénitas ou que seja considerada clinicamente relevante pelo investigador;
x) «Reacção adversa inesperada» a reacção adversa cuja natureza ou gravidade não esteja de acordo com a informação existente relativa ao medicamento, nomeadamente na brochura do investigador, no caso de medicamento experimental não autorizado, ou no resumo das características do medicamento, no caso de um medicamento autorizado.
Artigo 3.º
Primado da pessoa
1 – Os ensaios são realizados no estrito respeito pelo princípio da dignidade da pessoa e dos seus direitos fundamentais.
2 – Os direitos dos participantes nos ensaios prevalecem sempre sobre os interesses da ciência e da sociedade.
Artigo 4.º
Princípios de boas práticas clínicas
1 – Todos os ensaios, incluindo os estudos de biodisponibilidade e de bioequivalência, devem ser concebidos, realizados, registados e notificados de acordo com os princípios das boas práticas clínicas, aplicáveis à investigação em seres humanos.
2 – Os princípios das boas práticas clínicas e as linhas directrizes pormenorizadas conformes com esses princípios são adoptados e, se necessário, revistos, de acordo com o progresso científico e técnico, por deliberação do conselho de administração do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, adiante designado por INFARMED.
CAPÍTULO II
Direitos e deveres das partes no ensaio
SECÇÃO I
Dos participantes e sua protecção
Artigo 5.º
Avaliação de riscos e benefícios
1 – A realização de ensaios depende de avaliação prévia que conclua que os potenciais benefícios individuais para o participante no ensaio e para outros participantes, actuais ou futuros, superam os eventuais riscos e inconvenientes previsíveis.
2 – Compete ao conselho de administração do INFARMED deliberar sobre a avaliação e a conclusão referidas no número anterior, nos termos da presente lei.
3 – A decisão prevista no número anterior deve ser negativa, se os benefícios terapêuticos e para a saúde pública não justificarem os riscos.
4 – Durante a realização do ensaio, o respeito pelas condições estabelecidas no n.º 1 deverá ser objecto de supervisão permanente.
Artigo 6.º
Condições mínimas de protecção dos participantes
1 – Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, um ensaio só pode realizar-se se, em relação ao participante no ensaio ou, nos casos previstos nos artigos 7.º e 8.º, ao seu representante legal, forem cumpridos os seguintes requisitos:
a) Em entrevista prévia com o investigador ou um membro da equipa de investigação, lhe forem explicados, de modo completo e em linguagem adequada à sua capacidade de compreensão, os objectivos, os riscos e os inconvenientes do ensaio, bem como as condições em que este será realizado;
b) Na entrevista referida na alínea anterior, for informado do direito que lhe assiste de, a qualquer momento, se retirar do ensaio;
c) Estiver assegurado o direito à integridade moral e física, bem como o direito à privacidade e à protecção dos dados pessoais que lhe dizem respeito, de harmonia com o respectivo regime jurídico;
d) For obtido o consentimento livre e esclarecido, nos termos previstos na presente lei, devendo a correspondente declaração escrita conter a informação sobre a natureza, o alcance, as consequências e os riscos do ensaio;
e) Existir um seguro que cubra a responsabilidade do promotor, do investigador, da respectiva equipa e do proprietário ou órgão de gestão do centro de ensaio, nos termos do disposto no artigo 14.º;
f) Os cuidados médicos dispensados e as decisões médicas tomadas em relação ao participante forem da responsabilidade de um médico devidamente qualificado ou, se for o caso, de um dentista habilitado;
g) For designado um contacto, junto do qual seja possível obter informações mais detalhadas.
2 – O participante, ou o seu representante legal, pode revogar, a todo o tempo, o consentimento livre e esclarecido, sem que incorra em qualquer forma de responsabilidade ou possa ser objecto de quaisquer medidas que ponham em causa o direito à saúde e à integridade moral e física.
3 – A revogação não carece de forma especial, podendo ser expressa ou tácita.
Artigo 7.º
Participantes menores
Para além de outras condições impostas por lei, um ensaio apenas pode ser realizado em menores se:
a) Tiver sido obtido o consentimento livre e esclarecido do representante legal, o qual deve reflectir a vontade presumível do menor, podendo ser revogado a todo o tempo, sem prejuízo para este último;
b) O menor tiver recebido, por parte de pessoal qualificado do ponto de vista pedagógico, informações sobre o ensaio e os respectivos riscos e benefícios, adequadas à sua capacidade de compreensão;
c) O investigador ou, se for esse o caso, o investigador principal considerar o desejo expresso do menor que seja capaz de formar uma opinião e avaliar as informações de se recusar a participar ou de se retirar do ensaio a qualquer momento;
d) Não forem concedidos quaisquer incentivos ou benefícios financeiros, sem prejuízo do reembolso das despesas e do ressarcimento ou compensação pelos prejuízos sofridos com a participação no ensaio;
e) O ensaio tiver uma relação directa com o quadro clínico do menor ou quando, pela sua natureza, apenas puder ser realizado em menores e comportar benefícios directos para o grupo de participantes, desde que seja essencial para validar dados obtidos em ensaios realizados em pessoas capazes de dar o seu consentimento livre ou através de outros métodos de investigação;
f) Forem respeitadas as orientações científicas pertinentes aprovadas pelo conselho de administração do INFARMED, em consonância com as orientações da Agência Europeia de Medicamentos;
g) O ensaio tiver sido concebido para minimizar a dor, o mal-estar, o medo ou qualquer outro previsível risco relacionado com a doença e com o grau de sofrimento desta, devendo o limiar do risco e o grau de sofrimento ser especificamente fixados e objecto de permanente verificação;
h) O protocolo tiver sido aprovado pela comissão de ética competente, nos termos da presente lei, a qual, para o efeito, deve estar dotada de competência em matéria de pediatria ou obter aconselhamento sobre as questões clínicas, éticas e psicossociais da pediatria.
Artigo 8.º
Participantes maiores incapazes de darem o consentimento livre e esclarecido
1 – Sem prejuízo do disposto no artigo 6.º, quando um participante maior não estiver em condições de prestar o consentimento livre e esclarecido, a realização do ensaio depende do preenchimento cumulativo dos requisitos referidos nos números seguintes.
2 – A participação em ensaios de maiores que, antes do início da sua incapacidade, não tenham dado nem recusado o consentimento livre e esclarecido só é possível se:
a) Tiver sido obtido o consentimento livre e esclarecido do respectivo representante legal, nos termos do número seguinte;
b) A pessoa incapaz de dar o consentimento livre e esclarecido tiver recebido informações adequadas à sua capacidade de compreensão sobre o ensaio e os respectivos riscos e benefícios;
c) O investigador ou, se for esse o caso, o investigador principal considerar o desejo explícito do participante que seja capaz de formar uma opinião e avaliar as informações de se recusar a participar ou de se retirar do ensaio a qualquer momento;
d) Não forem concedidos quaisquer incentivos nem benefícios financeiros, sem prejuízo do reembolso das despesas e do ressarcimento ou compensação pelos prejuízos sofridos com a participação no ensaio;
e) O ensaio for essencial para validar dados obtidos em ensaios realizados em pessoas capazes de dar o consentimento livre e esclarecido ou através de outros métodos de investigação e estiver directamente relacionado com o quadro de perigo de vida ou de debilidade de que sofra o participante em causa;
f) O ensaio tiver sido concebido para minimizar a dor, o mal-estar, o medo ou qualquer outro previsível risco relacionado com a doença e com o grau de sofrimento desta, devendo o limiar de risco e o grau de sofrimento ser especificamente fixados e objecto de permanente verificação;
g) O protocolo tiver sido aprovado pela comissão de ética competente, nos termos da presente lei, a qual, para o efeito, deve estar dotada de competência específica no domínio da patologia e da população em causa ou obter o respectivo aconselhamento em questões clínicas, éticas e psicossociais ligadas à doença e à população em causa;
h) Existir a legítima expectativa de que a administração do medicamento experimental comporte para o participante benefícios que superem quaisquer riscos ou não impliquem risco algum.
3 – O consentimento livre e esclarecido prestado pelo representante legal deve reflectir a vontade presumível do participante, aplicando-se o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 6.º
SECÇÃO II
Dos responsáveis pela realização do ensaio
Artigo 9.º
Promotor
1 – O promotor ou o seu representante legal devem estar estabelecidos num Estado membro da União Europeia.
2 – Compete ao promotor:
a) Apresentar à CEIC o pedido de parecer, nos termos previstos na alínea b) do n.º 4 do artigo 18.º;
b) Requerer ao conselho de administração do INFARMED autorização para a realização do ensaio de acordo com o disposto no artigo 16.º;
c) Celebrar o contrato financeiro com o centro de ensaio, nos termos estabelecidos no artigo 12.º;
d) Propor o investigador, comprovando documentalmente a qualificação científica e a experiência profissional deste, e assegurar que este realiza o ensaio em conformidade com as exigências legais e regulamentares aplicáveis;
e) Facultar ao investigador todos os dados químico-farmacêuticos, toxicológicos, farmacológicos e clínicos relevantes que garantam a segurança do medicamento e todas as informações necessárias à boa condução dos ensaios;
f) Estabelecer e manter um sistema de segurança e vigilância do ensaio mediante monitorização efectuada sob responsabilidade médica;
g) Assegurar o cumprimento dos deveres de notificação, comunicação e de informação previstos na presente lei;
h) Notificar a conclusão do ensaio, em conformidade com o disposto no artigo 28.º;
i) Cumprir as demais obrigações legais e regulamentares aplicáveis.
3 – O promotor deve indicar a entidade e local junto da qual o participante pode obter mais informações pormenorizadas relativas ao ensaio.
Artigo 10.º
Investigador
Incumbe ao investigador, designadamente:
a) Realizar o ensaio em conformidade com as exigências legais e regulamentares aplicáveis;
b) Informar e esclarecer o participante ou o seu representante, nos termos da presente lei;
c) Obter o consentimento livre e esclarecido, nos termos da presente lei;
d) Cumprir os deveres de recolha, registo e notificação de reacções e acontecimentos adversos previstos na presente lei;
e) Propor ao promotor alterações ao protocolo, bem como a suspensão dos ensaios, sempre que ocorram razões justificativas;
f) Assegurar o registo rigoroso das fichas clínicas, bem como de todas as informações recolhidas durante o ensaio, e elaborar um relatório final;
g) Garantir a confidencialidade na preparação, realização e conclusão do ensaio, bem como das informações respeitantes aos participantes no ensaio;
h) Responsabilizar-se pelo acompanhamento médico dos participantes durante e após a conclusão do mesmo e manter o responsável do centro de ensaio informado do seu andamento.
Artigo 11.º
Monitor
1 – As informações a prestar pelo monitor ao promotor compreendem a verificação das condições indispensáveis à realização do ensaio, a informação prestada a toda a equipa de investigação e o cumprimento das condições de autorização.
2 – O monitor garante que os dados são registados de forma correcta e completa.
3 – O monitor deve ainda verificar se o armazenamento, a distribuição, a devolução e a documentação dos medicamentos em investigação cumprem com as normas de boas práticas clínicas.
Artigo 12.º
Contrato financeiro
1 – Os termos da realização do ensaio, as condições da sua efectivação e os aspectos económicos com ele relacionados devem constar de contrato a celebrar entre o promotor e o centro ou centros de ensaio envolvidos.
2 – Do contrato devem constar os seguintes elementos:
a) Os custos directos do ensaio estabelecidos pelo centro de ensaio, identificando, de forma individualizada, a remuneração do investigador e dos restantes membros da equipa;
b) Os custos indirectos, considerando-se como tais os dispendidos na utilização de meios auxiliares de diagnóstico, os decorrentes de internamento não previsto do participante, os decorrentes do reembolso das despesas e do ressarcimento ou compensação pelas despesas e pelos prejuízos sofridos pelo participante;
c) Os prazos de pagamento;
d) Todas as demais condições estabelecidas entre as partes.
Artigo 13.º
Remuneração do investigador
1 – Nas condições previstas no artigo anterior, é permitida a remuneração do investigador ou do investigador principal, conforme os casos, e dos membros da sua equipa referidos no n.º 6 do artigo 14.º
2 – Sempre que o investigador ou o investigador principal ou os membros da sua equipa sejam funcionários ou agentes do Serviço Nacional de Saúde, a remuneração prevista no contrato financeiro será paga pelo centro de ensaio.
Artigo 14.º
Responsabilidade
1 – O promotor e o investigador respondem, solidária e independentemente de culpa, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo participante imputáveis ao ensaio.
2 – O promotor deve obrigatoriamente contratar um seguro destinado a cobrir a responsabilidade civil estabelecida no número anterior.
3 – Presumem-se imputáveis ao ensaio os danos que afectem a saúde do participante durante a realização do ensaio e no ano seguinte à sua conclusão e, decorrido o período anteriormente referido, cabe ao participante provar que o dano é imputável ao ensaio.
4 – A autorização concedida pelo INFARMED e o parecer da comissão de ética competente não constituem fundamento de exclusão ou limitação da responsabilidade prevista no presente artigo.
5 – O disposto na presente lei não constitui fundamento para exoneração do promotor, do investigador, dos membros da respectiva equipa e do centro de ensaio das formas de responsabilidade disciplinar, civil, contra-ordenacional ou penal estabelecidas na lei.
6 – Para efeitos do número anterior, são considerados membros da equipa todos aqueles que integram a equipa de investigação e ainda os profissionais que, por força das suas funções, participam directa e imediatamente no ensaio.
CAPÍTULO III
Condições de realização do ensaio
Artigo 15.º
Autorização prévia
1 – A realização de ensaios carece de autorização prévia do conselho de administração do INFARMED, nos termos previstos nos artigos seguintes.
2 – O pedido de autorização pode ser apresentado simultaneamente com o pedido de parecer referido no artigo 20.º
Artigo 16.º
Procedimento de autorização prévia
1 – O pedido de autorização é apresentado pelo promotor, instruído com os seguintes elementos:
a) O protocolo;
b) A brochura do investigador;
c) A identificação completa do promotor do ensaio clínico, do investigador ou investigador principal e do investigador-coordenador;
d) A identificação e as qualificações de todos os membros da equipa envolvidos no ensaio clínico;
e) A identificação dos centros de ensaio envolvidos, bem como declaração emitida pelo responsável dos centros de ensaio indicando os termos da respectiva participação;
f) No caso de ensaios multicêntricos envolvendo centros de ensaio de outros Estados membros da União Europeia ou de países terceiros, a identificação das respectivas autoridades competentes, bem como, se existirem, os pareceres das comissões de ética aí proferidos, traduzidos para a língua portuguesa;
g) Os elementos referidos nas alíneas i), j) e l) do n.º 3 do artigo 20.º;
h) Outros elementos considerados necessários.
2 – No prazo não superior a 60 dias, o conselho de administração do INFARMED delibera sobre o pedido de autorização.
3 – Se o INFARMED solicitar ao requerente informações ou documentos complementares ao pedido apresentado, o prazo referido no número anterior suspende-se até à recepção das informações ou documentos em causa.
4 – A autorização considera-se tacitamente concedida se, cumulativamente:
a) Tiver decorrido o prazo previsto no n.º 2, descontado o período de suspensão previsto no n.º 3;
b) O INFARMED não tiver comunicado ao promotor o seu parecer negativo, nos termos do artigo 22.º, ou as suas objecções fundamentadas.
5 – No caso de o INFARMED emitir um parecer negativo, o promotor pode, no prazo que lhe for fixado para o efeito, alterar, uma única vez, o conteúdo do pedido de autorização, suspendendo-se o prazo do n.º 2 até à apresentação da modificação.
6 – A não modificação do pedido, em conformidade com o número anterior, implica a sua rejeição, não podendo realizar-se o ensaio.
Artigo 17.º
Casos especiais
1 – O INFARMED pode decidir sobre a necessidade de autorização expressa para os ensaios que envolvam medicamentos:
a) Sem autorização de introdução no mercado e que constem do anexo A do Regulamento (CEE) n.º 2309/93, do Conselho, de 22 de Julho;
b) Que apresentem características especiais, designadamente aqueles cujas substância ou substâncias activas sejam produtos biológicos de origem humana ou animal, contenham componentes biológicos de origem humana ou animal ou cuja produção requeira a utilização de tais componentes.
2 – Dependem sempre de autorização expressa os ensaios clínicos que envolvam os seguintes medicamentos:
a) De terapia génica;
b) De terapia celular somática;
c) Que contenham organismos geneticamente modificados;
d) De terapia celular xenogénica.
3 – Nos casos previstos nas alíneas a), b) e c) do número anterior, o prazo de 60 dias para a decisão pode ser prorrogado por mais 30 dias.
4 – O prazo de 90 dias referido no número anterior pode ainda ser prorrogado por mais 90 dias, caso haja lugar à consulta a grupos ou comités de peritos.
5 – A decisão relativa a ensaios que envolvam medicamentos de terapia celular xenogénica não está sujeita a qualquer prazo.
6 – Não podem ser realizados quaisquer ensaios envolvendo terapia génica que dêem origem a modificações na identidade genética germinal do participante.
7 – A autorização prevista na presente lei é concedida sem prejuízo da eventual aplicação dos regimes jurídicos relativos à utilização confinada de microrganismos geneticamente modificados e à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados.
Artigo 18.º
Comissão de Ética para a Investigação Clínica
1 – É criada a Comissão de Ética para a Investigação Clínica, adiante designada por CEIC, dotada de independência técnica e científica, cuja composição, financiamento e regras de funcionamento são objecto de portaria do Ministro da Saúde.
2 – A CEIC funciona na dependência do Ministro da Saúde, junto do INFARMED.
3 – Os membros da CEIC são nomeados por despacho do Ministro da Saúde, precedendo anuência do respectivo ministro da tutela, se for caso disso.
4 – A remuneração dos membros da CEIC é fixada por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Saúde.
5 – Compete à CEIC:
a) Definir os requisitos materiais e humanos que as comissões de ética para a saúde devem reunir para estarem habilitadas a emitir parecer quando para o efeito designadas pela CEIC;
b) Emitir o parecer previsto no artigo 20.º, sem prejuízo do disposto no artigo 19.º;
c) Receber e validar o pedido de parecer apresentado pelo promotor;
d) Acompanhar a actividade das comissões de ética para a saúde, no que concerne aos ensaios;
e) Elaborar o relatório anual de actividades e submetê-lo à apreciação do Ministro da Saúde.
6 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a CEIC poderá designar uma CES para a emissão do parecer, sempre que a especificidade do ensaio o exija ou se ocorrer outro motivo justificado, devendo comunicar ao promotor essa decisão.
7 – Compete à comissão que emite o parecer previsto na presente lei:
a) Avaliar de forma independente os aspectos metodológicos, éticos e legais dos ensaios que lhe são submetidos, bem como emitir os pareceres a que se referem os artigos 20.º e 23.º;
b) Monitorizar a execução dos ensaios, em especial no que diz respeito aos aspectos éticos e à segurança e integridade dos participantes;
c) Emitir parecer sobre a alteração, suspensão ou revogação da autorização concedida para a realização do ensaio;
d) Prestar todas as informações e esclarecimentos sobre os pedidos que lhe forem apresentados;
e) Assegurar a participação de peritos independentes na avaliação dos pedidos que lhe são remetidos, sempre que tal se revele necessário;
f) Assegurar o acompanhamento do ensaio desde o seu início até à apresentação do relatório final.
Artigo 19.º
Comissões de ética para a saúde
Nos casos e condições previstos no artigo anterior, as CES criadas pelo Decreto-Lei n.º 97/95, de 10 de Maio, são competentes para a emissão do parecer previsto na presente lei.
Artigo 20.º
Parecer
1 – A realização de ensaios é obrigatoriamente precedida de parecer favorável da comissão de ética designada nos termos da presente lei.
2 – O pedido de parecer é apresentado pelo promotor à CEIC, instruído de acordo com as indicações pormenorizadas a estabelecer por deliberação do conselho de administração do INFARMED.
3 – No seu parecer a comissão de ética competente deve pronunciar-se obrigatoriamente sobre:
a) A pertinência do ensaio e da sua concepção;
b) Se o resultado da avaliação dos benefícios e riscos previsíveis é favorável;
c) O protocolo;
d) A aptidão do investigador principal e dos restantes membros da equipa;
e) A brochura do investigador;
f) A qualidade das instalações;
g) A adequação e o carácter exaustivo das informações escritas a prestar, assim como o procedimento de obtenção do consentimento livre e esclarecido;
h) A fundamentação da realização do ensaio em pessoas incapazes de prestar o consentimento livre e esclarecido, nos termos da alínea e) do artigo 7.º e da alínea e) do n.º 2 do artigo 8.º;
i) As disposições sobre indemnização e compensação por danos patrimoniais e não patrimoniais, incluindo o dano morte, imputáveis ao ensaio;
j) Todos os seguros destinados a cobrir a responsabilidade do investigador e do promotor;
l) Os montantes e as modalidades de retribuição ou compensação eventuais dos investigadores e dos participantes nos ensaios clínicos e os elementos pertinentes de qualquer contrato financeiro previsto entre o promotor e o centro de ensaio;
m) As modalidades de recrutamento dos participantes.
4 – O parecer fundamentado deve ser comunicado à CEIC, ao requerente e ao INFARMED, no prazo máximo de 60 dias, a contar da recepção do pedido pela CEIC, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
5 – A articulação entre a CEIC e a CES bem como os critérios de designação da comissão de ética que emite o parecer previsto na presente lei são regulados por portaria do Ministro da Saúde.
Artigo 21.º
Suspensão e prorrogação de prazos
1 – No decurso do prazo previsto no n.º 4 do artigo anterior e do n.º 4 do artigo 23.º, a comissão de ética competente pode solicitar, uma única vez, informações complementares ao requerente.
2 – No caso previsto no número anterior, o prazo para a emissão do parecer suspende-se até à recepção das informações requeridas.
3 – O prazo para a emissão do parecer pode ser prorrogado por mais 30 dias quando os ensaios clínicos envolvam medicamentos:
a) De terapia génica;
b) De terapia celular somática;
c) Que contenham organismos geneticamente modificados.
4 – Quando o prazo referido no número anterior for de 90 dias pode ainda ser prorrogado por mais 90 dias, caso haja lugar à consulta a grupos ou comités de peritos.
5 – O parecer sobre ensaios que envolvam medicamentos de terapia celular xenogénica não está sujeito a qualquer prazo.
Artigo 22.º
Parecer do INFARMED
1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, o INFARMED pode emitir parecer sobre os elementos previstos nas alíneas i), j) e l) do n.º 3 do artigo 20.º, para os efeitos previstos nos n.os 3 a 6 do artigo 16.º
2 – O parecer do INFARMED é notificado ao promotor no prazo máximo de 60 dias a contar da data da apresentação do pedido referido no n.º 1 do artigo 16.º
CAPÍTULO IV
Realização de ensaios clínicos
Artigo 23.º
Alterações ao protocolo
1 – Após o início de um ensaio, o promotor pode introduzir modificações no protocolo desde que estas não sejam substanciais e:
a) Não tenham incidências na segurança dos participantes;
b) Não alterem a interpretação das provas científicas em que assenta a realização do ensaio.
2 – Caso se verifiquem algumas das circunstâncias referidas no número anterior, a modificação do protocolo é requerida pelo promotor à comissão de ética competente e só pode realizar-se após parecer favorável desta.
3 – No caso previsto no número anterior, o promotor deve igualmente notificar ao INFARMED os motivos e o teor das alterações propostas.
4 – A comissão de ética emite o parecer no prazo de 35 dias contados da data do pedido referido no n.º 2, com base nos elementos referidos no n.º 3 do artigo 20.º e nos pareceres adoptados no quadro de ensaios multicêntricos.
5 – Se o parecer for favorável e o INFARMED ou qualquer das autoridades dos restantes Estados membros envolvidos não emitirem objecções fundamentadas, o promotor prossegue o ensaio de acordo com o protocolo alterado.
6 – Se o parecer for favorável mas o INFARMED ou qualquer das autoridades dos restantes Estados membros envolvidos emitirem objecções fundamentadas, o promotor só pode prosseguir o ensaio se adaptar o protocolo às objecções transmitidas ou se retirar a proposta de modificação.
Artigo 24.º
Medidas urgentes de segurança
1 – Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, o promotor e o investigador adoptam todas as medidas urgentes que se mostrem adequadas à protecção dos participantes contra qualquer risco imediato para a sua segurança, nomeadamente resultante da superveniência de qualquer facto relacionado com o desenrolar do ensaio clínico ou com o desenvolvimento do medicamento experimental.
2 – O promotor transmite sem demora ao INFARMED, às demais autoridades competentes dos Estados membros envolvidos e à comissão de ética os elementos de risco e as medidas adoptadas.
Artigo 25.º
Suspensão ou revogação da autorização do ensaio
1 – O INFARMED pode suspender ou revogar a autorização concedida se tiver razões objectivas para considerar que deixaram de estar preenchidas as condições em que se fundamentou a autorização ou se dispuser de informação que suscite dúvidas quanto à segurança ou ao fundamento científico do ensaio clínico.
2 – Excepto em caso de urgência, a deliberação de suspensão ou revogação da autorização do ensaio clínico deve ser precedida de audiência escrita do promotor, o qual dispõe do prazo de sete dias consecutivos para o efeito.
3 – A deliberação do INFARMED é notificada, simultaneamente, ao promotor, às autoridades competentes dos outros Estados membros envolvidos, à Comissão Europeia, à Agência Europeia de Medicamentos e à comissão de ética competente.
4 – Existindo motivos objectivos para considerar que qualquer interveniente no ensaio e, em particular, o promotor ou o investigador, não cumpra as suas obrigações, o INFARMED comunica ao faltoso as medidas que este deve adoptar para corrigir a referida situação.
5 – As medidas referidas no número anterior são igualmente transmitidas às demais autoridades competentes dos Estados membros envolvidos, à Comissão Europeia e, consoante o caso, à comissão de ética para a saúde competente e à CEIC.
Artigo 26.º
Registo e notificação de acontecimentos adversos
1 – O investigador deve notificar ao promotor, no prazo máximo de vinte e quatro horas, todos os acontecimentos adversos graves, excepto os que se encontrem identificados no protocolo ou na brochura do investigador como não carecendo de notificação imediata.
2 – Após a notificação referida no número anterior, o investigador apresenta ao promotor um relatório escrito pormenorizado, no prazo máximo de cinco dias.
3 – Na notificação e nos relatórios posteriores, os participantes são identificados por meio de um número de código.
4 – Os acontecimentos adversos ou os resultados anormais das análises laboratoriais definidos no protocolo como determinantes para as avaliações de segurança são igualmente notificados, de acordo com os requisitos de notificação e dentro dos prazos especificados no protocolo.
5 – Em caso de notificação da morte de um participante, o investigador transmite ao promotor e à comissão de ética competente todas as informações complementares que lhe sejam solicitadas.
6 – O promotor deve manter registos pormenorizados de todos os acontecimentos adversos que lhe sejam notificados por qualquer investigador, devendo, se solicitado a fazê-lo, enviá-los às autoridades dos Estados membros envolvidos.
Artigo 27.º
Notificação de reacções adversas graves
1 – O promotor deve assegurar que todos os dados importantes relativos a suspeitas de reacções adversas graves inesperadas que tenham causado ou possam causar a morte do participante são registados e notificados ao INFARMED, às autoridades competentes de todos os Estados membros envolvidos e à comissão de ética competente, no prazo máximo de sete dias contados a partir do momento em que deles tomar conhecimento.
2 – Toda a informação superveniente considerada relevante deve ser comunicada no prazo de oito dias contados do termo do prazo previsto no número anterior.
3 – Todas as outras suspeitas de reacções adversas graves inesperadas devem ser notificadas pelo promotor ao INFARMED, às restantes autoridades competentes envolvidas e à comissão de ética competente tão cedo quanto possível, no prazo máximo de 15 dias contados a partir do seu conhecimento pelo promotor.
4 – O INFARMED regista todas as suspeitas de reacções adversas graves inesperadas de um medicamento experimental que lhe sejam notificadas.
5 – Durante a realização do ensaio e até à sua conclusão, o promotor deve apresentar anualmente ao INFARMED e à comissão de ética competente uma lista de todas as suspeitas de reacções adversas graves ocorridas durante esse período, bem como um relatório relativo à segurança dos participantes.
6 – O promotor informará, igualmente, os restantes investigadores.
Artigo 28.º
Conclusão do ensaio clínico
1 – A conclusão do ensaio deve ser notificada pelo promotor ao INFARMED e demais autoridades competentes envolvidas, bem como à comissão de ética competente, no prazo de 90 dias.
2 – Se a conclusão do ensaio tiver de ser antecipada, o prazo previsto no número anterior é reduzido para 15 dias, devendo os motivos ser claramente expostos na notificação.
3 – A notificação é elaborada e apresentada de acordo com as indicações pormenorizadas aprovadas por deliberação do conselho de administração do INFARMED.
CAPÍTULO V
Medicamentos experimentais
Artigo 29.º
Fabrico ou importação de medicamentos experimentais
1 – O fabrico ou importação de medicamentos experimentais estão sujeitos a autorização do conselho de administração do INFARMED, que é válida durante o período de realização do ensaio.
2 – A instrução do pedido de autorização de fabrico ou importação bem como as informações que devem constar da apresentação do requerimento são definidas por deliberação do conselho de administração do INFARMED.
3 – O fabrico e a importação observam o disposto nas normas sobre boas práticas de fabrico dos medicamentos de uso humano, aprovadas por portaria do Ministro da Saúde.
Artigo 30.º
Obrigação do titular da autorização
1 – O titular da autorização referida no artigo anterior fica obrigado a dispor, de forma efectiva e permanente, de um farmacêutico qualificado, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/88, de 15 de Janeiro, no que se refere ao fabrico e ao controlo de qualidade de medicamentos, que assuma as obrigações referidas no artigo seguinte.
2 – O titular da autorização é solidariamente responsável com o técnico referido no número anterior.
Artigo 31.º
Obrigações do farmacêutico
1 – Sem prejuízo das suas relações com o fabricante e o importador, o farmacêutico qualificado referido no n.º 1 do artigo anterior é, nomeadamente, responsável:
a) Em relação ao fabrico e controlo de cada lote de medicamentos experimentais fabricado em Portugal, pelo cumprimento de normas que estabelecem os princípios e directrizes de boas práticas de fabrico de medicamentos experimentais, de acordo com as especificações do produto e a informação transmitida para efeitos do disposto no artigo 16.º;
b) Em relação ao controlo de cada lote de medicamentos experimentais fabricado em países terceiros, pelo cumprimento de normas no mínimo equivalentes às referidas na alínea anterior, de acordo com as especificações do produto e a informação transmitida para efeitos do disposto no artigo 16.º;
c) Em relação aos medicamentos experimentais que sejam medicamentos de comparação provenientes de países terceiros e neles possuam uma autorização de introdução no mercado, pelo respeito pelas normas referidas nas alíneas anteriores, ou, na impossibilidade de tal comprovação documental, pela realização das análises, ensaios ou verificações necessários para confirmar que a sua qualidade está conforme com a informação notificada juntamente com o pedido de autorização, nos termos do disposto no artigo 16.º, sem prejuízo das inspecções a que haja lugar;
d) Em relação a cada lote de fabrico, pelo registo e atestação, em livro de registo próprio ou documento equivalente;
e) Pela actualização permanente do livro de registo ou documento equivalente referidos na alínea anterior.
2 – O livro de registo ou documento equivalente deve ser mantido à disposição da autoridade competente durante 10 anos.
3 – Os medicamentos experimentais provenientes de outro Estado membro da União Europeia não estão sujeitos a quaisquer controlos posteriores, desde que:
a) Esteja cumprido o disposto nas alíneas a), b) ou c) do n.º 1;
b) Se apresentem acompanhados dos certificados de libertação dos lotes, assinados pelo técnico qualificado.
Artigo 32.º
Rotulagem de medicamentos experimentais
1 – As informações que figuram na embalagem exterior dos medicamentos experimentais ou, se esta não existir, no respectivo acondicionamento primário devem ser redigidas em língua portuguesa.
2 – As informações podem igualmente ser redigidas noutras línguas, sem prejuízo do disposto no número anterior.
3 – As informações referidas no n.º 1 devem observar as normas de boas práticas de fabrico dos medicamentos de uso humano.
4 – As normas referidas no número anterior devem conter disposições específicas no respeitante à rotulagem de medicamentos experimentais que apresentem as seguintes características:
a) Não requeiram, para a sua concepção, um fabrico ou uma embalagem particular;
b) Sejam realizados com medicamentos experimentais que, nos Estados membros envolvidos, beneficiem de uma autorização de introdução no mercado e tenham sido fabricados ou importados de acordo com o regime jurídico dos medicamentos de uso humano;
c) Os participantes no ensaio clínico apresentem situações clínicas que estejam incluídas nas indicações constantes da autorização de introdução no mercado do referido medicamento.
CAPÍTULO VI
Competência, fiscalização e controlo
Artigo 33.º
Autoridade competente
1 – O INFARMED é a autoridade competente, para os efeitos previstos na presente lei, cabendo-lhe ainda proceder à inspecção das boas práticas de ensaios clínicos, no contexto de um ensaio clínico ou fora dele.
2 – Tendo em vista verificar o cumprimento das disposições relativas às boas práticas clínicas e às boas práticas de fabrico, o INFARMED credenciará trabalhadores seus para inspeccionar, nomeadamente:
a) Os locais concretos onde o ensaio clínico se realiza;
b) O local concreto de fabrico do medicamento experimental;
c) Os laboratórios de análises utilizados para o ensaio clínico;
d) As instalações do promotor.
3 – O INFARMED, através dos seus trabalhadores credenciados para o efeito, pode ainda:
a) Proceder, nas instalações do promotor ou do centro de ensaio, à recolha e apreensão da documentação relacionada com o ensaio clínico, sempre que tal diligência se revele necessária à obtenção de prova;
b) Proceder à selagem dos locais das instalações do promotor ou do centro de ensaio em que se encontrem ou sejam susceptíveis de encontrar documentação e outros elementos de informação necessários à obtenção de prova, durante o período e na medida estritamente necessária à realização das diligências a que se refere a alínea anterior.
4 – As inspecções são realizadas em nome da União Europeia, em articulação com as instâncias internacionais competentes, por iniciativa do INFARMED ou a requerimento da Comissão Europeia.
5 – O INFARMED comunica a realização da inspecção e os respectivos resultados à Agência Europeia de Medicamentos.
6 – Os resultados das inspecções realizadas pelas autoridades competentes de outros Estados membros, ao abrigo das obrigações impostas pela ordem jurídica comunitária, são reconhecidos pelo INFARMED.
7 – Após a realização da inspecção, o INFARMED elabora um relatório da inspecção, que deve ser colocado à disposição da entidade inspeccionada, salvo na parte que contenha informações confidenciais.
8 – Mediante a apresentação de pedido fundamentado, o INFARMED pode ainda disponibilizar o relatório da inspecção às autoridades competentes de outros Estados membros, à Agência Europeia de Medicamentos ou à comissão de ética competente.
Artigo 34.º
Contra-ordenações
1 – Sem prejuízo da responsabilidade civil, penal ou disciplinar pelos factos em causa, constitui contra-ordenação punível com coima no montante mínimo de (euro) 5000 e máximo de (euro) 500000:
a) A realização de ensaio sem autorização do INFARMED ou em desconformidade com os termos em que a mesma foi concedida;
b) A realização de ensaio clínico sem o parecer favorável da comissão de ética para a saúde competente;
c) A realização ou continuação de ensaio em centro de ensaio não dotado dos meios materiais e humanos adequados;
d) A continuação de ensaio cuja autorização haja sido suspensa ou revogada;
e) A utilização de medicamento experimental fora das condições previstas na presente lei;
f) A violação dos deveres de confidencialidade e de protecção dos dados pessoais dos participantes no ensaio;
g) A realização de ensaio sem que o participante tenha sido previamente informado dos seus objectivos, riscos, inconvenientes do ensaio e condições em que este será realizado ou prestado o consentimento livre e esclarecido;
h) O incumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 9.º;
i) A concessão aos participantes de quaisquer incentivos ou benefícios financeiros não permitidos pela presente lei;
j) O fabrico ou importação de medicamentos experimentais sem autorização;
l) O incumprimento das disposições regulamentares aprovadas ao abrigo da presente lei.
2 – A tentativa e a negligência são puníveis.
Artigo 35.º
Processo de contra-ordenação
1 – A instrução dos processos de contra-ordenação compete ao INFARMED.
2 – A aplicação das coimas compete ao presidente do conselho de administração do INFARMED.
Artigo 36.º
Afectação do produto das coimas
O produto das coimas cobradas é distribuído da seguinte forma:
a) 40% para o INFARMED;
b) 60% para o Estado.
CAPÍTULO VII
Intercâmbio de informações
Artigo 37.º
Base de dados
1 – O INFARMED é responsável pela criação de uma base de dados sobre ensaios clínicos efectuados nos centros de ensaio situados no território nacional, que deve incluir o registo pormenorizado:
a) Dos dados extraídos do pedido de autorização referido no artigo 16.º;
b) Das alterações ao pedido referido na alínea anterior, na sequência de apresentação de objecções fundamentadas pelo INFARMED, nos termos previstos no n.º 5 do artigo 16.º;
c) Do parecer previsto no artigo 20.º;
d) Das alterações ao protocolo, nos termos previstos no artigo 23.º;
e) Da notificação prevista no artigo 28.º;
f) Da menção das inspecções realizadas para verificar a observância das boas práticas clínicas;
g) Dos dados relativos aos casos de suspeitas de reacções adversas graves inesperadas previstas no artigo 26.º, que tenham sido levadas ao seu conhecimento.
2 – Os dados contidos na base de dados referida no número anterior podem ser disponibilizados pelo INFARMED, mediante pedido fundamentado e observadas as necessárias garantias de confidencialidade, à comissão de ética competente e a outras entidades que nisso demonstrem interesse relevante.
3 – O INFARMED colabora com a Comissão Europeia no cumprimento das obrigações que a esta incumbem, por força da legislação comunitária aplicável, designadamente no respeitante à introdução na base de dados europeia dos dados referidos no n.º 1, nos termos do artigo seguinte.
4 – Só podem aceder à base de dados europeia as autoridades competentes dos Estados membros, a Agência Europeia de Medicamentos e a Comissão Europeia.
5 – Para além dos elementos introduzidos na base de dados europeia, o INFARMED só fornece informações complementares relativas a um ensaio mediante pedido fundamentado apresentado por uma das entidades referidas no número anterior.
6 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, o INFARMED poderá publicar no seu sítio na Internet informação referente aos ensaios clínicos autorizados em Portugal, centros de ensaio envolvidos, área terapêutica e respectiva população em estudo, salvo oposição expressa do promotor.
Artigo 38.º
Normas orientadoras
O conselho de administração do INFARMED aprova, tendo em conta as directrizes aprovadas a nível comunitário e para efeitos de aplicação no território nacional, normas orientadoras, designadamente relativas à:
a) Definição de princípios de boas práticas clínicas;
b) Apresentação e conteúdo do pedido previsto no artigo 16.º;
c) Documentação a apresentar em apoio do pedido referido na alínea anterior, relativa à qualidade e fabrico do medicamento experimental, aos testes toxicológicos e farmacológicos, ao protocolo e às informações clínicas relativas ao medicamento experimental, nomeadamente a brochura para o investigador;
d) Apresentação do pedido e documentação a apresentar aquando do pedido de parecer previsto no artigo 20.º;
e) Apresentação e conteúdo da proposta de alteração do protocolo, após o início do ensaio, nos termos previstos no artigo 23.º, no respeitante às alterações substanciais nele introduzidas;
f) Notificação de conclusão do ensaio clínico prevista no artigo 28.º;
g) Base de dados europeia e intercâmbio dos dados dela constantes, por via electrónica, no respeito estrito pelo princípio da confidencialidade dos mesmos;
h) Requisitos mínimos para a autorização de fabrico ou importação de medicamentos experimentais, aplicáveis tanto ao requerente como, posteriormente, ao titular;
i) Informações que devem constar da embalagem exterior ou do acondicionamento primário de um medicamento experimental;
j) Documentação sobre o ensaio que constitua o seu processo permanente, métodos de arquivo, qualificação dos inspectores e procedimentos de inspecção destinados a verificar a conformidade do ensaio com as disposições normativas aplicáveis;
l) Recolha, verificação e apresentação dos relatórios sobre os acontecimentos ou reacções adversas, assim como as modalidades de descodificação relativas às reacções adversas inesperadas.
CAPÍTULO VIII
Disposições finais
Artigo 39.º
Fornecimento gratuito e uso compassivo
1 – Os medicamentos experimentais e os dispositivos utilizados para a sua administração, bem como os demais medicamentos já autorizados eventualmente necessários à realização de ensaios, são fornecidos gratuitamente pelo promotor.
2 – Após a conclusão do ensaio, o medicamento experimental deve, até à sua introdução no mercado, ser disponibilizado gratuitamente pelo promotor ao participante, desde que o investigador considere indispensável a continuação da sua utilização pelo mesmo e não existam alternativas terapêuticas.
3 – Para efeitos do disposto no número anterior, deve o investigador:
a) Obter o consentimento livre e esclarecido do participante ou do seu representante legal;
b) Apresentar relatório clínico justificativo da necessidade de continuação do tratamento;
c) Comunicar ao INFARMED, no prazo mais curto possível, a continuação da administração do medicamento em causa;
d) Informar o responsável pela unidade de saúde da continuação da administração do medicamento;
e) Notificar ao INFARMED os acontecimentos adversos que ocorram no decurso da administração do medicamento.
Artigo 40.º
Custos
Os custos dos actos relativos aos procedimentos previstos na presente lei constituem encargo dos requerentes, de acordo com tabela fixada por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Saúde.
Artigo 41.º
Circuito do medicamento experimental
1 – Nos estabelecimentos de saúde integrados no Serviço Nacional de Saúde, os medicamentos experimentais e os dispositivos utilizados para a sua administração, bem como os demais medicamentos já autorizados eventualmente necessários ou complementares à realização de ensaios, devem ser armazenados e cedidos pelos respectivos serviços farmacêuticos hospitalares.
2 – Para efeitos do número anterior, os serviços farmacêuticos hospitalares devem manter registos e confirmação do armazenamento e da utilização dos medicamentos destinados à realização dos ensaios.
Artigo 42.º
Impugnação
As decisões proferidas no âmbito da presente lei são impugnáveis judicialmente, nos termos gerais.
Artigo 43.º
Confidencialidade
Todos aqueles que, em qualquer qualidade, intervenham em ensaios ou que, por qualquer forma, tenham conhecimento da sua realização, ficam obrigados ao dever de sigilo sobre quaisquer dados pessoais a que tenham acesso.
Artigo 44.º
Contagem dos prazos
À contagem dos prazos previstos na presente lei são aplicáveis as regras estabelecidas no artigo 279.º do Código Civil.
Artigo 45.º
Norma transitória
1 – As receitas a cobrar nos termos do artigo 40.º constituem receita do INFARMED.
2 – As receitas a cobrar durante o corrente ano serão inscritas no orçamento do INFARMED a fim de contribuírem para o financiamento das actividades relativas à implementação da presente lei, nomeadamente no que se refere à instalação da CEIC.
Artigo 46.º
Norma revogatória
É revogado o Decreto-Lei n.º 97/94, de 9 de Abril.
Artigo 47.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprovada em 8 de Julho de 2004.
O Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral.
Promulgada em 2 de Agosto de 2004.
Publique-se.
O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendada em 5 de Agosto de 2004.
O Primeiro-Ministro, Pedro Miguel de Santana Lopes.